Realmente é triste e espantoso.
Há poucos dias, atendendo ao impulso quase vício de entrar em livrarias,
perguntei a uma vendedora pela estante de literatura brasileira, pois, o que se
via eram letreiros como literatura
estrangeira, autoajuda, administração, esotéricos, idiomas, etc., menos o
que eu procurava.
Não havia um letreiro literatura brasileira ou nacional, muito menos de poesia. A gentil vendedora mostrou-me,
em uma gôndola, dizendo: Aqui, senhor, na parte de baixo. Perguntei-lhe pelos
livros de poesia, ao que ela respondeu ‘Ah, poesia? Olha, só temos esses aqui’.
Havia alguns livros de Ferreira Gullar e de Fernando Pessoa, misturados a uma
miscelânea de romances e contos em português, de autores já consagrados. Como
de outras vezes, senti-me imerso numa banheira de gelo, até cair na real.
Caí na real, mesmo às vésperas
de completar uma dúzia de livros publicados sob
demanda. Esse tipo, o de pequenas tiragens, ainda é o mais acessível. Por
outro lado, essas editoras não têm a penetração que as tradicionalmente famosas
têm. A venda é difícil, temos que ir a campo, no porta-a-porta, como vendedores
de cocada, que arrecadam bem mais nas campanhas de quermesses. Esses têm a boca
adoçada pelo açúcar queimado das cocadas... Nós... A boca amarga pelas palavras de tristeza e
revolta contra a ganância das grandes editoras, que estão aí para fazer
dinheiro. Elas crescem na razão direta da ignorância e do desinteresse dos
chamados agentes culturais. Hoje,
quando se lê uma coluna de Cultura,
se lê notícias de shows musicais, teatro, dança, lançamento de algum romance ou
ficção, que fazem parte da cultura dos povos, mas, nem sombra do que venha a
ser poesia. Um jornal conceituado do Rio estampa em uma página Prosa e Verso. É um colunista que
escreve. De verso, nem o reverso.
A poesia pode estar em tudo que
vemos, para nós poetas. Para os não poetas, ela é ‘jurássica’. Ela só aparece
nas letras de algumas... De algumas músicas... A poesia está perdendo a
contemporaneidade. A maioria das pessoas não sonha, fornica; não ama, fica; não
olha nos olhos, olha no display que
não sai da palma da mão; o belo não está nos versos de um livro, mas nos gadgets do isolamento físico, nos
relacionamentos virtuais e nos jogos onde a máquina é o competidor! O poeta
está se tornando poeta de si próprio. Eu sou um deles e, assim, continuarei a
escrever poesias, ainda que para mim, e quando não mais puder escrever,
pensarei poesia, pois ela nos leva por caminhos onde os transeuntes são a
brisa, a água da chuva, a natureza e o canto da cotovia.
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